STJ decide que Google terá de fornecer dados do caso Marielle Franco
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça negou, nesta quarta-feira (26) um recurso do Google contra a decisão da Justiça do Rio que determinou que a empresa a fornecesse informações ao inquérito sobre as mortes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Na prática, o Google terá que fornecer dados do caso.
Os dados, de acordo com os investigadores, são essenciais para se chegar aos mandantes do crime, mas o Google alega que o pedido fere o direito à privacidade dos usuários e pode transformar um serviço de pesquisa na internet em ferramenta para vigilância indiscriminada dos cidadãos.
O relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, votou para negar o recurso do Google. “Não vi qualquer direcionamento para revelação de nomes de pessoas, apenas a identificação de dados que identifiquem correspondências de acesso a aplicativos ou informações que permitam chegar a um número reduzido de possíveis pessoas que poderiam ter relação aos fatos, mas que não serão expostas em sua privacidade”, disse o ministro.
O ministro afirmou que lhe causa estranheza essa a extrema preocupação da empresa na preservação de sigilo de terceiros e usuários quando não se tem notícia de pessoas incomodadas com essa investigação. “Uma investigação que deve ser elogiada e agora se busca autoria de mandantes. Uma investigação que não se limitou a métodos tradicionais, que são confissões e reconhecimentos, métodos úteis, mas em situações complexas não podem ser suficientes”, explicou.
Segundo o ministro, “pela dimensão que representa, alguém que foi assassinado por fazer a defesa de direitos humanos, e de outro uma milícia violenta que oprime e assassina que se colocam contra essa banda podre do estado, não é compreensível que se tenha tamanha preocupação que algo que não acontece no caso.
“Não vejo nenhuma invasão a intimidade de pessoas que transitavam nessa área e passam a ser aparelhos de investigação. Não há ilegalidade porque as decisões foram motivadas em leis, e não há ilegalidades nas medidas dadas por instancias menores”, afirmou.
O ministro foi seguido pelos ministros Antonio Saldanha Palheiro, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Joel Ilan, Felix Fischer, Laurita Vaz, Jorge Mussi, Sebastião Reis.
Empresa vê limites
Na sessão, o advogado Eduardo Mendonça, que representa o Google, afirmou que houve fornecimento de dados de 400 pessoas, contas bancárias de 30 pessoas e fez contribuições relevantes, mas que existem limites no fornecimento de dados.
“São ordem genéricas de pessoas genéricas que não tem participação em fatos investigados. O fornecimento deles representaria uma violação da privacidade de pessoas que não estão envolvidas no crime e não são sequer investigadas”, disse o advogado.
O Google argumentou ainda que o caráter genérico da solicitação viola a Constituição e o Marco Civil da Internet. Acrescentou também que uma decisão neste sentido poderia abrir precedentes para que outras situações de quebra em massa do sigilo de informações ocorressem no futuro.
O MPPJ disse que as decisões em segunda instância confirmaram o entendimento da 4ª Vara da Comarca da Capital que havia deferido, nos autos de inquérito policial que investiga os homicídios, diversas medidas cautelares que poderão contribuir para elucidar a identificação de outras pessoas que porventura estejam envolvidas nos crimes”, diz a nota do MPRJ.
Entenda o caso
A vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes foram vítimas de atentado a tiros em 14 de março de 2018. Nas investigações conduzidas no Rio de Janeiro, foram presos preventivamente e indiciados pelo crime no dia 12 de março de 2019 o sargento aposentado Ronnie Lessa e o ex-policial Élcio Queiroz. No dia 27 de julho, a Terceira Seção negou o pedido para transferir à esfera federal a investigação do crime.
O pedido feito em agosto de 2018 pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Rio, autorizado pela primeira instância da Justiça do Rio, solicita a lista dos IPs e Device IDs de usuários que pesquisaram as combinações de palavras “Marielle Franco”, “Vereadora Marielle”, “Agenda vereadora Marielle”, “Casa das Pretas”, “Agenda vereadora Marielle”, e “Rua dos Inválidos”, entre os dias 7 de 14 de março de 2018.
Em dezembro de 2018, o Google recorreu da decisão da 1ª instância do Tribunal de Justiça do Rio. No recurso, a empresa de internet alegou que as “palavras-chave” são termos comuns, potencialmente pesquisados por milhares de pessoas para os mais diversos fins plenamente lícitos.
O mandante do crime, até hoje desconhecido, poderia ser encontrado por meio do cruzamento de dados de quem estava no carro com os de quem fez buscas sobre a agenda da vereadora. A Justiça do Rio já deu duas decisões favoráveis ao compartilhamento dos dados, mas o Google recorreu ao STJ.
(CNN Brasil)