•  quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Vivemos juntos ou morreremos sozinhos

A primeira vez que tive contato com a expressão “vivemos juntos ou morremos sozinhos” foi na primeira temporada da série Lost (e se você acha que estavam todos mortos desde o início, algo que os produtores, autores, atores e todo mundo que entendeu a série já explicou que não, por favor, reveja mais umas vezes até entender). Enfim, na situação, Jack usa o discurso para unir os sobreviventes do acidente do avião que cai numa ilha aparentemente deserta, explicando que eles deveriam trabalhar juntos para sobreviver.

Só depois conheci a citação de Martin Luther King, de que “ou vivemos todos juntos, como irmãos, ou morremos todos juntos, como idiotas”. Infelizmente, parece que ele subestimou a nossa idiotice.

Quando o coronavírus surgiu, assustando todo mundo, nos perguntávamos como passaríamos pela crise e acreditávamos, inocentemente, que sairíamos melhor do que entramos, que as pessoas teriam capacidade de entender a necessidade de pensar no outro além de si próprias para que todos pudéssemos avançar. Mas não foi bem assim.

Apesar dos negacionistas – como parlamentar e empresário dizendo que “só ia matar entre 800 e 7 mil pessoas, e mesmo assim, dos mais velhos e já doentes” (vamos passar dos 158 mil mortos no momento) – começamos com o “fique em casa” trazendo esperança e muitos, mesmo prejudicados pela iniciativa, entenderam a importância de um isolamento inicial para conter uma alta contaminação e lotação dos serviços de saúde. E acabaram sendo “feitos de trouxa”, já que, enquanto comércios fechavam as portas, quem poderia ficar realmente em casa, promovia festas e aglomerações sem preocupação (Alô Pugliesi).

Essa falta de união resultou que, mesmo com muita coisa obrigatoriamente fechada, o famigerado “coronga” fez a festa pelo país e os números pareciam não baixar. Tanto que nos primeiros sinais de redução das mortes, muita gente acreditou que poderia voltar à vida normal e passou a ignorar o vírus. Mesmo com mais de mil mortes diárias – e os números hoje ainda passam de 400 na média diária, o que continua sendo muito.

Mas se não poderíamos ficar trancados pelo resto da vida – ou até que o vírus sumisse totalmente –, pelo menos encontramos ferramentas para prevenir o vírus, como o álcool em gel e a máscara, que deveria ser um item obrigatório (e é) em ambientes públicos, principalmente locais fechados, mas virou “frescura” para alguns e “restrição à liberdade” para outros. Oi?

Sim, isso mesmo, um ato simples como usar máscara, não apenas para se proteger, mas para proteger as pessoas ao seu redor – já que você pode transmitir o vírus sem saber – virou uma disputa chamada por alguns de “focinheira ideológica”. Bom, se a ideologia é respeito ao próximo, pode me chamar de extremista então.

Por fim, tivemos a guerra da vacina que sequer existe ainda, e se o Brasil acabou sendo um dos locais onde mais se fez testes é por ser um dos países em que mais houve (há) casos, lembrando que somos o segundo, atrás apenas dos EUA, em números absolutos de mortos e em sexto por milhão de pessoas (o que não significa tanto, já que em primeiro está San Marino, com população de pouco mais de 30 mil pessoas e 42 mortes).

Além disso, embora a corrida para desenvolver uma vacina cause receio por conta da falta de tempo para mais testes, a discussão ideológica sobre ser chinesa, russa, britânica ou americana, inclui diversos estapafúrdios – e tem gente que acredita que a vacina vai nos monitorar via 5G.

Lembrando que obrigatoriedade não significa ter a casa invadida por agentes de jaleco branco para vacinar à força, mas restrições no convívio social ou para viagens, como já acontece com a de febre amarela, por exemplo, sem a qual não se pode ir para alguns países.

Enfim, assim como em Lost, parece que estamos mesmo todos perdidos e nesse ritmo, não duvido que estejamos aplaudindo a volta de doenças erradicadas, discutindo seriamente a Terra plana e voltando a queimar mulheres na fogueira por bruxaria.

O século XVIII é logo ali.

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