Não tenha filho
Quem me conhece há mais tempo sabe que ter filho nunca esteve, necessariamente, entre minhas prioridades. Não que eu tenha algo contra crianças e nem que seja egoísta a ponto de não abrir mão de certas facilidades da vida por conta de uma (não?), mas é porque sempre soube que isso traz uma responsabilidade grande, uma mudança inegável na vida.
A verdade é que, depois de ter um filho, você nunca mais será o mesmo. Lembro que em uma conversa entre Bob Harris (interpretado por Bill Murray) e Charlotte (vivida por Scarlett Johansson) em Encontros e Desencontros, um dos meus filmes preferidos de todos os tempos, ambos falavam brevemente sobre isso, algo que já me fazia pensar.
Claro, há exageros e pessoas que depois de procriarem passam a ignorar completamente a própria individualidade e viver exclusivamente em função do filho, o que eu considero um equívoco de diversas formas. Um erro, aliás, que procuro não cometer.
Ter um filho (ou filha, deixando bem claro) também tem impactos diferentes para cada pessoa, não apenas para o papai ou a mamãe, como também no contexto. Uma gravidez indesejada na adolescência trará muitas dificuldades que um casal que planejou a gestação não terá, além das dúvidas sobre o que fazer.
Por isso mesmo, quando alguém cheio de dúvidas sobre ter filhos me pergunta, tendo a responder com sinceridade: Não tenha filho.
Não tenha filho se você não estiver preparado para amar incondicionalmente uma criaturinha que, basicamente, nem tem consciência da própria existência no início e tão pouco é capaz de te perceber, mas, ainda assim, qualquer espasmo facial te fará rir feito um bobalhão, mesmo que saiba que ele não está rindo para você (seu coração não se importará).
Não tenha filho se não estiver disposto a perder horas de sono ou com medo de dormir apenas para verificar a cada momento se ele está respirando. Se não estiver disposto a levantar a cada choro, sem se importar com a hora ou com quanto tempo vai levar para que possa dormir novamente.
Sim, não tenha filho se não preparar o nariz (e o estômago) para situações que são nojentas, mas que você vai se importar bem menos por se tratar da sua criança. Trocar fraldas está longe de ser uma atividade agradável, para dizer o mínimo. Mas a não ser que queira ser um pai ausente ou desleixado, terá que fazê-lo e vai achar normal.
Então, não tenha filho se não estiver pronto para sentir seu coração se partir cada vez que tiver de deixá-lo, ainda que momentaneamente, ainda que com seus pais. Parece exagero, mas há momentos em que se afastar realmente causa esse efeito.
Não tenha filho se não quiser se emocionar com gestos pequenos, mas que significarão mais do que o homem caminhando na lua. Se não quiser viver experiências indescritíveis. Se não quiser vibrar com um passinho. Se não quiser se divertir com gritos que não são palavras.
Se não estiver preparado psicologicamente para assistir incontáveis horas de Mundo Bita, Fazendinha do Zenon e sei lá mais quantos programas infantis, mesmo na hora do jogo.
Não tenha filho se não aceitar dividir sua comida, mesmo que seja só para aplacar a gula e curiosidade, enquanto você mesmo terá que comer usando só uma mão, já que a outra vai estar carregando o guloso.
Enfim, poderia seguir citando motivos para não ter filhos. Mas se, mesmo assim, você decidir contrariar essas dicas, te desafio a sentir arrependimento ou mesmo cansaço que não seja superado por um sorriso dele.
Por: Luciano Rodrigues